quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Uma casa na escuridão


Quando li esse livro pela primeira vez em 2010, nada conhecia sobre o autor. Havia lido todos os livros da Inês Pedrosa e amado, e procurava na livraria mais literatura portuguesa para ler quando encontrei "Uma Casa na Escuridão" e resolvi arriscar. A narrativa de José Luís Peixoto era poética, mas bem diferente dos textos da Inês. Comecei a ler intrigada, sem saber muito bem onde aquela história ia chegar.
Fui grifando trechos do livro já desde o início, seja porque eram poéticos e de imensa beleza, seja porque me faziam refletir e estabelecer conexões com outros textos, outras vivências, no que eu chamo de conversa livro-leitor. Quanto mais grifos há num livro que eu li, maior sinal de que gostei do que li. 
Mas a história, apesar dos trechos poéticos que me encantavam, seguia por caminhos diferentes do que eu esperava encontrar quando comprei o livro. Realismo mágico português? Caminhos por vezes intensos, sofridos, com cenas fortes que por vezes foi necessário parar a leitura para respirar. Mas onde que esse livro vai parar?, pensava eu. Mesclando momentos assim, em que o leitor mais sensível sente lhe faltar o ar com passagens de grande força poética, a história se desenrola de forma intensa; é mesmo uma casa na escuridão. Mas mesmo nessa escuridão eu consegui encontrar luz no texto do JLP. Pontos de doçura, delicadeza e poesia. Como nesse trecho aqui:

"O amor é o sangue do sol dentro do sol. A inocência repetida mil vezes na vontade sincera de desejar que o céu compreenda. Levantam-se tempestades frágeis e delicadas na respiração vegetal do amor. Como uma planta a crescer da terra. O amor é a luz do sol a beber a voz doce dessa planta. Algo dentro de qualquer coisa profunda. O amor é o sentido de todas as palavras impossíveis. Atravessar o interior de uma montanha. Correr pelas horas originais do mundo. O amor é a paz fresca e a combustão de um incêndio dentro, dentro, dentro, dentro dos dias. Em cada instante da manhã, o céu a deslizar como um rio. À tarde, o sol como uma certeza. O amor é feito de claridade e da seiva das rochas. O amor é feito de mar, de ondas na distância do oceano e da areia eterna. O amor é feito de tantas coisas opostas e verdadeiras. Nascem lugares para o amor e, nesses jardins etéreos, a salvação é uma brisa que cai sobre o rosto suavemente." (pág. 28)

Não sei se era o momento certo para ler o livro, ou se o compreendi como deveria, se é que é possível todos compreendermos os livros como deveríamos, mas quando terminei de ler achei difícil dizer algo sobre ele. O JLP diz que esse é seu livro mais difícil, que os leitores costumam amá-lo ou odiá-lo, mas não conseguia me definir por nenhum dos extremos. Não o amei por conta das partes por vezes tão pesadas, mas certamente não o odiei, porque ele contém tantos grifos de partes que me encantaram. Se não tivesse gostado, acredito que não teria procurado outros livros do JLP para ler. Mas creio que não o compreendi por inteiro, creio que fiquei na metade do caminho.

Depois de ter lido os outros livros do José Luís e admirá-lo cada vez mais, acho que estava mais preparada para ler uma casa na escuridão uma segunda vez. Já não tinha mais a angústia de não saber onde aquela história ia parar; já sabia mais um pouco sobre o autor; já estava mais madura como leitora para dizer algo sobre o livro.
Continuo amando a escrita poética que me encanta; continuo precisando de ar em algumas partes, porque isso não muda. Mas talvez agora tenha caminhado um pouco mais nessa leitura, já não estou mais no meio do caminho. E se essa casa é a humanidade e estamos em muitos momentos na escuridão de atitudes e pensamentos tão desumanos da época em que vivemos, eu fico feliz por ter tido olhos para encontrar pontos de luz no texto, pontos de esperança na vida.

Esse livro é e será sempre especial para mim por muitos motivos: por ter sido o primeiro livro do JLP que eu li; por ter a descrição mais linda e poética do que é tradução que eu já vi na vida (mais precisamente nas páginas 262,263 e 271) e sendo tradutora isso já bastava para me conquistar para todo o sempre; e também porque de todos os autógrafos que eu ganhei do Zé Luís, esse é o mais bonito, um dos mais especiais para mim.

José Luís Peixoto. Uma casa na escuridão. Rio de Janeiro: Record, 2009.

2 comentários:

mm amarelo disse...

Engraçado, estou vivendo isso com Henry James agora. "Os Embaixadores" foi o primeiro livro que li dele, e dizem que é o mais complexo e mais difícil de ler. Mas resolvi tentar mesmo assim, e de fato, foi difícil. E tive a mesma sensação, de não estar preparada, de que algo havia passado e não havia captado. Pretendo voltar a ele daqui a uns anos.
beijo grande,
Maira

Pipa disse...

Nunca li nada de Henry James, vou anotar aqui na minha listinha :)

Vale a pena ler o José Luís Peixoto também, que eu amo de paixão :)

beijos!

Pipa