terça-feira, 29 de outubro de 2019

O peso do pássaro morto



Romance de estreia da escritora paulista Aline Bei, O peso do pássaro morto (2017) foi vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura na categoria autor estreante com menos de quarenta anos. O romance - assim classificado pela autora -  é um poema narrativo que apresenta uma forma fragmentada, por vezes usando os recursos da poesia, como as rimas, a sonoridade das palavras e a construção de imagens poética, narra a vida de uma menina, uma protagonista cujo nome não sabemos, da infância à idade adulta, constituindo-se portanto em uma narrativa de formação.

Cada capítulo é nomeado de acordo com a idade da personagem e cada idade é marcada por uma perda que transforma a personagem pela violência com que acontecem. Segundo explicado pela autora em uma entrevista, a ideia do livro surge a partir de uma cena que acontece ainda na infância da personagem, quando ela segura um pássaro e este morre em suas mãos. Assim, este é um romance sobre perdas e a sensação de desamparo que elas acarretam na vida de qualquer um de nós. É um romance narrado pela perspectiva social feminina, registrando também as diversas violências que uma mulher sofre ao longo da vida, problematizando o impacto que o silêncio sobre a violência vivida tem na vida das sobreviventes. É também um romance que nos faz pensar sobre a maternidade, e os mitos que a cercam, levando muitas vezes as mães ao sofrimento psíquico.

O peso do pássaro morto é um belíssimo romance de estreia, e que consegue falar de temas muito importantes com grande leveza.

BEI, Aline. O peso do pássaro morto. São Paulo: Editora Nós, 2017.

O homem que plantava árvores



Em tempos de tantas tragédias ambientais, esta fábula de Jean Giono surgiu como um consolo. A edição linda e ilustrada da Editora 34 foi um presente à parte.
A história é muito simples, e talvez mesmo por isso, seja uma dessas leituras que são como um abraço e alimentam em nós um tantinho de esperança. Ao passar por um pequeno vilarejo, o narrador avista um homem que caminhava e plantava árvores. Era isso que fazia dos seus dias, apesar da sua idade, ainda encontrava-se em forma. O lugar já estava bem deserto e sem árvores, não havia mais trabalho por ali e as pessoas saíam em busca de outras opções. Mas o homem continuava caminhando todos os dias, retirando as bolotas de carvalho do bolso e plantando fileiras e mais fileiras do que um dia seriam árvores, se vingassem.
A presença daquele homem ali chama a atenção do narrador, que dele se aproxima e com quem conversa. A história daquele homem que plantava árvores apesar da devastação ao redor despertava mesmo a curiosidade do narrador. Anos depois, ao retornar ao vilarejo, o narrador não pode deixar de notar a mudança na paisagem. A vegetação ali havia se transformado. E o homem continuava por ali, caminhando todos os dias e plantando suas árvores, em sua persistente determinação em fazer sua parte, apesar de.
Na última vez que o narrador ali regressa, anos depois, depois da grande guerra, encontra o cenário transformado. Ali havia uma floresta, que ninguém sabia como havia brotado ali e era digna de investigação. O narrador então sabe que o velho, agora com a idade bem mais avançada, se não tivesse morrido, era o responsável por tudo aquilo. 
Uma história que poderia ter sido totalmente inventada, não fossem as histórias tão inspiradas nas vidas que nos rodeiam, como os leitores poderão ver no prólogo do livro, sobre o qual não comentarei, que é para não tirar o encanto e a surpresa. Apenas digo que vale a pena.


GIONO, Jean. O homem que plantava árvores. Trad. Cecília Ciscato e Samuel Titan Jr. São Paulo: Editora 34, 2018.