A situação humana reúne as palestras proferidas por Aldous Huxley em
1959, na Universidade de Santa Bárbara, Estados Unidos, e aborda os mais
diversos temas, desde a educação e a relação do homem com a natureza, até
religião e arte, crescimento populacional e o inconsciente. Por serem
palestras, o texto é fluido, quase como uma conversa, abordando assuntos
diferentes e (alguns deles) ainda relevantes nos dias de hoje. Nessa minha
primeira aproximação à obra de Huxley (sim, ainda não tinha lido nada do autor,
nem mesmo a obra que o tornou célebre, Admirável
mundo novo), confesso que inicialmente achei que não fosse gostar. Mas o
texto me surpreendeu, pois algumas reflexões do autor, que revelam sua
preocupação em compreender o mundo que lhe cerca, são interessantes.
Logo
de início, no primeiro ensaio sobre educação integrada (e um dos que eu mais
gostei), Huxley destaca um aspecto do nosso sistema educacional que, ainda nos
dias de hoje, todos aqueles e aquelas que trabalham com educação certamente já
consideraram em algum momento de suas carreiras: a especialização cada vez
maior que trilhamos na academia sem nem sempre levar em conta um conhecimento
interdisciplinar que só amplia a nossa capacidade de compreender o ser humano e
suas relações com o mundo.
“Como todos sabemos, aprender pouco é algo perigoso. Mas uma boa porção de aprendizado altamente especializado também é uma coisa perigosa, e por vezes pode ser ainda mais perigoso do que aprender só um pouco. Um dos principais problemas da educação superior agora é conciliar as exigências da muita aprendizagem, que é essencialmente uma aprendizagem especializada, com as exigências da pouca aprendizagem, que é a abordagem mais ampla, menos profunda, dos problemas humanos em geral” (p.7).
No
ensaio “Guerra e nacionalismo”, no qual o autor tenta entender as origens da
guerra e chegar a um conceito do que entende por nação, vale destacar seu
posicionamento de que a violência da guerra é também uma construção social e
não algo inerente ao homem.
“É muito importante lembrar que tanto a guerra quanto o poder motivador que leva o homem à guerra são socialmente condicionados, porque assim percebemos que não há nada de biologicamente inevitável nessa terrível coisa que nos ameaça. Por ser um fenômeno socialmente condicionado, poderemos, se quisermos, descondicioná-lo e livrar-nos dele” (p. 89).
Outro
ensaio que gostei é o intitulado “Linguagem”, no qual o autor discorre sobre o
papel da linguagem e das palavras como diferencial humano e também como um meio
através do qual ideias, boas e más, são transmitidas, evidenciando o poder da
palavra.
“A linguagem é o que nos torna humanos. Infelizmente, é também o que nos torna humanos demais. De um lado, é a mãe da ciência e da filosofia, e de outro produz toda a sorte de superstição, preconceito e loucura. Ajuda-nos e nos destrói; torna possível a civilização e também produz aqueles assustadores conflitos que degradam a civilização” (p. 190).
Cada
uma das palestras em A situação humana
demonstra como Huxley era um homem atento e interessado em refletir e questionar
os mais diversos assuntos debatidos em sua época. E para nós, talvez o mais
interessante aqui seja acompanhar seus pensamentos para refletir sobre as
nossas questões hoje, o que mudou, ou o que ainda permanece relevante para os
nossos dias. Não é um livro cansativo, já que a linguagem mais fluida ajuda
bastante a acompanhar o raciocínio do autor, mas é um livro que contém muitas
informações e muitas referências e que, por isso, pede uma leitura mais
atenta. Por serem ensaios independentes, os leitores também podem decidir em
que ordem cada um deles será lido.
Sobre
o autor
Aldous
Huxley nasceu em 26 de julho de 1894 no condado de Surrey, na Inglaterra. Em
1916, publica seu primeiro livro, uma coletânea de poemas. A partir de 1921,
sua reputação literária se estabelece, através de Crome yellow. Em seguida, escreve Antic hay (1923), Folhas
inúteis (1925) e Contraponto
(1928), sátiras onde analisa de modo espirituoso e implacável os dissabores do
mundo moderno. No período anterior à Segunda Guerra Mundial, sua obra adquire
tons mais sombrios, incluindo o célebre romance Admirável mundo novo (1932), antiutopia que descreve a desumanizada
sociedade do futuro, e Sem olhos em Gaza
(1936), uma novela pacifista. Em 1937, deixa a Europa e se muda para a
Califórnia. Além de ensaios sobre assuntos tanto culturais quanto religiosos,
em que se nota a forte influência da mística oriental, Huxley publicou O tempo deve parar (1944), O macaco e a essência (1949), A ilha (1962) e As portas da percepção (1954), onde descreve suas experiências com
a mescalina. Aldous Huxley faleceu em 22 de novembro de 1963.
HUXLEY, Aldous. A situação humana. Trad. Lya Luft. São Paulo: Biblioteca Azul, 2016.
*Recebi este livro como cortesia da Globo Livros
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