Em Hibisco Roxo, a escritora Chimamanda Ngozi Adichie conta a história de uma família nigeriana bem sucedida e aparentemente "normal". E por normal aqui eu quero dizer aparentemente feliz. O patriarca da família, Eugene, é um homem rico, que possui várias indústrias e é dono de um dos principais jornais locais. Eugene é um dos homens mais poderosos e respeitados na comunidade e na igreja católica que frequenta, muito em virtude de todas as doações generosas que faz para ajudar a igreja e muitas pessoas da comunidade. Ele é tido como um modelo a ser seguido por sua moral e conduta. Eugene é casado com Beatrice e tem dois filhos: Jaja e Kambili, ambos adolescentes. Os dois estudam em excelentes escolas e moram com os pais em uma casa grande, com todo o conforto que a maioria dos nigerianos desconhece.
Mas em casa Eugene é um tirano que adora ordem e detesta ser contrariado no que quer que seja, e sempre controla cada passo dos filhos e da esposa. O clima de medo, silenciamento e opressão que reina na casa pode ser observado nos momentos tensos em que se reúnem para as refeições ou para ir à missa. As crianças crescem ouvindo que precisam ser perfeitas, que tem que ser as primeiras de suas turmas e vivem em constante pânico por isso. Estão em constante estado de alerta preocupadas em agradar o pai.
A religião tem uma grande importância para Eugene, que age de forma obsessiva em nome do discurso religioso. Mas o discurso religioso, quando não é posto em prática nas ações do dia a dia, só gera destruição. Essa é a história de uma família que vai se destruindo por conta a intolerância religiosa e da violência doméstica, pois Eugene renega seu próprio pai por ele não ter se convertido à religião "branca" dos colonizadores que ele foi ensinado a seguir rigorosamente e que agora tenta a todo custo impor aos filhos e à esposa. É também um livro que nos permite analisar a situação da mulher em um tempo não muito distante do nosso, pois ainda hoje muitas mulheres vivem em função do casamento, guiadas pela pressão social que valida a existência de uma mulher somente se ela se casar e tiver filhos. Beatrice, que vive em função do marido e dos filhos mesmo sofrendo de violência doméstica, ainda acha que uma mulher sem marido não é nada. No decorrer da história acompanhamos seu sofrimento em silêncio a cada espancamento que sofre do marido pelas mínimas coisas, surras tão violentas que a fazem abortar diversas vezes, impedindo-a de ter mais filhos e debilitando seriamente sua saúde. O sofrimento dos filhos ao vivenciar tudo isso, crescendo em um ambiente onde ninguém sorri ou conversa, provoca neles sentimentos confusos, que misturam o amor que os filhos naturalmente sentem pelo pai, com o terror de vê-lo como principal causador de seus medos e sofrimentos.
Mas também temos nessa história uma personagem que traz um pouco de alívio depois de tantas páginas em que sofremos juntos com essa família: a tia Ifeoma, irmã de Eugene, uma professora que ficou viúva de um homem que sempre a respeitou nunca a agrediu, e que mostra que há mais caminhos para as mulheres do que o casamento. É com amor e liberdade de diálogo, ensinando aos filhos e sobrinhos a questionarem o mundo e dizer o que sentem, buscando o conhecimento através da educação, que Ifeoma consegue ajudar Jaja e Kambili a se libertarem da opressão em que vivem.
Um livro que eu gostaria que todos lessem, por todas as coisas que ele nos faz sentir e pensar. Uma história linda, sofrida, mas com toda a poesia das descrições quase que sensoriais de Chimamanda Adichie, que nos transporta pelas ruas da Nigéria, onde podemos sentir o cheiro do caju e dos hibiscos roxos. Não sei recomendá-lo o suficiente. Leiam!
ADICHIE, Chimamanda Ngozi. Hibisco Roxo. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. 324 páginas
3 comentários:
Um dos livros da minha vida!
Amei a resenha, paula!
Beijo,
Obrigada, Denise! Também amei esse livro!! :)
beijo,
Pipa
Olá boa tarde!
Qual o crédito que devo colocar? Estou compartilhando a resenha do livro Hibisco Roxo.
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