segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

.


E uma canção desesperada
(Lívia Natália)

A dor de uma mulher tem infinitas máscaras,
mas permanece dor, sob as cores pintadas.
A dor de uma mulher não dorme cedo,
ela espreita toda sua vida
e seu coração se crispa em segredo.

A dor de uma mulher não tem fantasmas,
não anda no escuro, ela se recolhe nas suas entranhas
como quem costura o imenso véu
que lhe cobrirá as feridas.

A dor de uma mulher tem que ser das mais fortes,
tem que ferir este bicho de morte,
este animal que sangra e sobrevive
às suas dobras vincadas de dor e medo.
Neste bicho estranho que se pinta de vermelho,
dentro e fora têm a mesma face estranha e calma.

A dor de uma mulher é violenta,
e ladra bestializada de seus próprios precipícios.
Crava seus dentes no tempo,
chora silente pra dentro
e se cura das feridas nos dias.

NATÁLIA, Lívia. Água Negra e outras águas. 2 ed. Salvador: Caramurê Publicações, 2016. p. 97

2 comentários:

Felicidade Clandestina. disse...

que texto significativo e forte!! <3 as dores das mulheres não dormem cedo...

Conversa de Livro disse...

Que lindo! Não conhecia a escrita da Lívia? Ela é baiana? Beijos! ;)